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A crise da culpabilidade na sentença penal

Mestrado em Direito Processual e Cidadania
Autor: Sérgio Simão Dias
Orientador: Fábio André Guaragni
Defendido em: 23/02/2006

Resumo

A crise da culpabilidade reflete o apego incondicionado do hermeneuta ao positivismo legalista na sentença penal, em total abstração à realidade humana do acusado. Nesse sentido, exsurge a problemática central pautada no livre arbítrio como pressuposto metafísico do juízo de reprovação, além da linguagem vaga e abstrata dos requisitos jurídicos do reproche, como se as palavras tivessem o condão de criar a censura do injusto penal forjando o contexto histórico social do agente. Ademais, a relevância do tema mantém pertinente liame com o Estado Democrático de Direito, pois a observância e aplicação do princípio da culpabilidade simboliza o imprescindível respeito à dignidade do imputado, limite e fundamento do ius puniendi estatal. Cumpre realçar que a culpabilidade, elemento dogmático do delito, muitas vezes não é objeto de análise na sentença penal, limitando-se ao injusto (tipicidade e ilicitude), o que colide com uma das razões de ser do elemento subjetivo do delito como mais um “cinturão” de garantia ao imputado. Considerar a reprovação circunscrita à primeira fase da dosimetria da pena, prevista no artigo 59 do Código Penal, significa dosar a culpabilidade sem que estivesse existido previamente o delito. A reprovação do agente que concretiza o injusto penal principia pela faticidade concreta do seu mundo de vida, pois ocultar ou idealizar sua existencialidade reflete um paradigma descontextualizado na dimensão do reproche. Para fazer frente às expressões metafísicas e cumprir o discurso garantista do direito penal, o juiz não pode limitar-se ao positivismo legalista, mas sim naufragar no cipoal do existencialismo concreto, a fim de aferir a dirigibilidade normativa do imputado. O agir comunicativo constitui referencial seguro na análise da potencial consciência da ilicitude, na medida em que a circunstância sócio-cultural do agente pode influir na consciência potencial da ilicitude, mormente se levar em consideração o interacionismo simbólico entre significante e significado haurido no mundo de vida. O referencial epistemológico da culpabilidade, além do prisma individual e social, opera no modelo de direito penal mínimo. Nesse passo, salutar a criação judicial de causas supralegais de reprovabilidade da conduta, não circunscritas ao clássico estado de necessidade exculpante, que se limita a validar o sacrifício de bens jurídicos de igual ou menor valor. A crise da culpabilidade é caudatária do paradigma hermeneutico de que se vale o operador do direito, modelo esse circunscrito ao silogismo formal e abstrato quando o juiz trabalha com a reprovabilidade da conduta. Em suma, a análise da crise da culpabilidade é atual e merece uma análise à luz do Estado Democrático de Direito interdisciplinado com agir comunicativo permeado pelo mundo de vida, realidade histórico-cultural, oportunidade social, filosofia, política criminal, criminologia e sociologia do direito, além de outras “circunstâncias relevantes” (art. 66 do CP) na equação da dirigibilidade normativa, até porque o tema “culpabilidade” não contém resposta irrefutável, pronta e acabada. Portanto, existem diretrizes garantistas que o juiz deve observar e efetivamente cumprir quando trabalhar com o requisito subjetivo do delito na sentença penal a fim de assegurar concretude ao discurso do direito: respeito à dignidade da pessoa humana.

Palavras-chave

Processo Penal. culpabilidade na sentença penal


Abstract

The speech that guarantees the Penal Law does not apply to the penal sentence. Through this path, the crisis of the culpability is its epistemological reflex. The central problem, besides the free will as a metaphysical post of reprobation, is also present in the vague and abstract language used in the censure requirements, as if the words had the power to create the reprobation of the penal unfair by forging the reality. The relevance of the theme goes together with the Democratic State of Law, as the loyal observance and appliance of the culpability principle symbolises respect to the dignity of the suspect, which is the limit and principle of the stately jus puniendi. Moreover, it is important to highlight that the culpability, dogmatic element of the offence, many times is not an object of analysis in the penal sentence, limiting itself to the penal unfair (what is typical and what is wrong), which collides with one of the reasons of existence of the subjective element of the offence an extra point in favor of the accused. To consider the circumscribed reprobation in the first period of the dosimetry of the penalty, as seen on the 58th article of the Penal Code, means to dose the culpability even though the offence has not been committed. Under this parameter, the reprobation of the agent who makes the penal injustice concrete starts from the concrete facts of his lifestyle, because metaphysically hiding or idealizing his existence shows a paradigm which is out of context in the dimension of the censure. There is a epistemological cut in the individual understanding of culpability, because the social-historic- cultural reference is a safe and democratic guideline for the measuring of the subjective requirement of the offence. The penal sentence which works under a model of language circumscribed to a metaphysical model of demand of diverse conduct and evident presumption of the potential awareness of error makes up what is named the 'Horror Penal Law'. Through this measure, the culpability crisis is caused by the interpretation of the law operator, a model which is circumscribed to the formal and abstract syllogism when the judge works with the reprobation of behaviour. It is usual in judicial decisions, though mistaken, to claim that in the phase of the 59th article of the Brazilian Penal Code that: ‘ As for the culpability, I consider deceit to be this very penal type’ , in obvious confusion with the subjective element of the type which is distinct in the measure of censure as well as in the dogmatic requirement of offence. To sum up, the analysis of the crisis of culpability is current and deserves attention in the light of the Democratic State of Law, and inter disciplined with a communicative act permeated by the world of each one, historic-cultural reality, social opportunity, philosophy, criminal policies, criminology and sociology of law, besides other ‘relevant circumstances’ (66th article, PC) in the equation of normative management, even because the theme culpability does not contain the ready and finished answers. Therefore, there are some guidelines of guarantee and the judge must respect and obey them when working with the subjective requirement of the final sentence, so as to ensure basis to the law speech: the right for dignity for every human being.

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